Introdução
Princípios físicos
Escoamento Unidimensional
Escoamento com variação de área
Choque Normal
Escoamento com troca de Calor (Escoamento de Rayleigh)
Escoamento unidimensional com atrito
Certificado

FT2.T. Bocal convergente – divergente

Duração do vídeo: 25min40s

Tempo estimado de leitura: 11 minutos



Vimos como as propriedades do escoamento variam quando ele é levado à condição de estagnação ou o oposto, quando, partindo da condição de estagnação, é acelerado (no caso de reservatórios pressurizados em que se permite a expansão livre).

Se quisermos controlar o escoamento, com o intuito de maximizar o empuxo gerado pela exaustão, devemos fazer o uso de bocais.

O escoamento em bocais é um escoamento com mudança de área. Entretanto, vamos considerar uma mudança gradual, o que permite tratar o escoamento como quase-unidimensional, ou seja, as propriedades variam na direção do escoamento somente.

O objetivo do bocal é o de converter energia térmica, da saída do combustor, em energia cinética, o que resulta em maior empuxo gerado.

Para a análise de bocais, vamos considerar:

  • Mudança gradual da área: o perfil de velocidade é uniforme e varia na direção do escoamento somente
  • desprezar efeitos viscosos
  • isoentrópico (sem onda de choque)
  • regime permanente

Da equação da conservação de massa, temos:

(1)   \begin{equation*}\dot{m} = \rho.V.A = constante\end{equation*}

Diferenciando a equação:

(2)   \begin{equation*}V.A.d\rho + \rho.A.dV + \rho.V.dA = 0\end{equation*}

Dividindo pela taxa mássica \dot{m}:

    \begin{equation*}\frac{V.A.d\rho}{\rho.V.A} + \frac{\rho.A.dV}{\rho.V.A} + \frac{\rho.V.dA}{\rho.V.A} =0\end{equation*}

(3)   \begin{equation*}\frac{d\rho}{\rho} + \frac{dV}{V} + \frac{dA}{A} = 0 \end{equation*}

Cada termo da Eq.(3) é um termo de dilatação, ou seja, representa a variação da propriedade. Para escoamento incompressível d\rho=0, portanto:

    \begin{equation*}\frac{dV}{V} + \frac{dA}{A} = 0\end{equation*}

(4)   \begin{equation*}\boxed{\frac{dV}{V} =- \frac{dA}{A} }\end{equation*}

A Eq.(4) indica que, para escoamento incompressível, a variação da área e a variação da velocidade têm comportamentos opostos. Ou seja:

  • Se a área aumenta, dA>0 e portanto dV<0
    • A velocidade diminui com o aumento da area
  • \item Se a área diminui, dA<0 e portanto dV>0
    • A velocidade aumenta com a diminuição da área

Para escoamentos compressíveis, o termo d\rho \neq 0, o que implica que há outras maneiras de satisfazer a equação da continuidade.

Sabemos que a entalpia de estagnação é h_0=h+\frac{V^2}{2} = constante. Derivando essa equação:

(5)   \begin{equation*}dh_0=dh+V.dV=0\end{equation*}

Da equação de Gibbs:

    \begin{equation*}T.ds = dh-v.dP\end{equation*}


Como o escoameto é isoentrópico:

(6)   \begin{equation*}dh=v.dP = \frac{dP}{\rho}\end{equation*}

Substituindo na Eq.(5):

    \begin{equation*}dh+V.dV=0\end{equation*}

(7)   \begin{equation*}\boxed{\frac{dP}{\rho} + V.dV=0 }\end{equation*}

A Eq.(7) indica que pressão e velocidade sempre têm tendências opostas.

Da definição da velocidade do som: c^2 = \left(\frac{\partial P}{\partial \rho}\right)_s. Logo:

(8)   \begin{equation*}dP = c^2.d\rho\end{equation*}

Substituindo na Eq.(7):

    \begin{equation*}\begin{aligned}\frac{dP}{\rho} + V.dV&=0 \\\frac{c^2.d\rho}{\rho} + V.dV&=0 \\\frac{d\rho}{\rho} + \frac{V.dV}{c^2} &=0\\\frac{d\rho}{\rho} + \frac{V.dV}{c^2}.\frac{V}{V} &=0\\\frac{d\rho}{\rho} + \frac{V^2.dV}{c^2.V} &=0\\\frac{d\rho}{\rho} + M^2.\frac{dV}{V} &=0\\\end{aligned}\end{equation*}

(9)   \begin{equation*}\boxed{\frac{d\rho}{\rho} =- M^2.\frac{dV}{V} }\end{equation*}

A Eq.(9) indica que a massa específica e a velocidade sempre mudam em direções opostas.

Substituindo a Eq.(9) na equação da continuidade:

    \begin{equation*}\begin{aligned}\frac{d \rho}{\rho} + \frac{dV}{V} + \frac{dA}{A} &= 0 \\- M^2.\frac{dV}{V} + \frac{dV}{V} + \frac{dA}{A} &= 0 \\\frac{dV}{V}(1-M^2) &= \frac{-dA}{A} \\\end{aligned}\end{equation*}

(10)   \begin{equation*}\boxed{\frac{dV}{V} = -\frac{1}{1-M^2}\frac{dA}{A}}\end{equation*}

A Eq.(10) nos fornece a relação entre a variação da velocidade em função da variação da área para o escoamento em função do número de Mach. Substituindo na Eq.(7):

    \begin{equation*}\begin{aligned}\frac{dP}{\rho} + V.dV &= 0 \\\frac{dP}{\rho.V^2} +\frac{V.dV}{V^2} &= 0 \\\frac{dP}{\rho.V^2} +\frac{dV}{V} &= 0 \\\frac{dP}{\rho.V^2} -\frac{1}{1-M^2}\frac{dA}{A} &= 0 \\\end{aligned}\end{equation*}

(11)   \begin{equation*}\boxed{\frac{dP}{\rho.V^2} =\frac{1}{1-M^2}\frac{dA}{A} = 0} \end{equation*}

A Eq.(11) nos fornece a relação entre a variação da pressão em função da variação da área para o escoamento em função do número de Mach.

Para escoamento subsônico, M<1 e o termo 1-M^2 >0. Dessa forma:

(12)   \begin{equation*}\frac{dV}{V} \propto -\frac{dA}{A}\end{equation*}

e

(13)   \begin{equation*}\frac{dP}{\rho.V^2} \propto \frac{dA}{A}\end{equation*}

Ou seja, para escoamento subsônico, área e velocidade têm direções opostas e área e pressão têm mesma direção de variação.

  • Um aumento de área dA>0 implica em:
    • diminuição da velocidade dV<0
    • aumento da pressão dP>0
  • Uma diminuição da área dA<0 implica em
    • aumento da velocidade dV>0
    • diminuição da pressão dP<0

Para escoamento supersônico, entretanto, M>1 e o termo 1-M^2<0. Assim:

(14)   \begin{equation*}\frac{dV}{V} \propto +\frac{dA}{A}\end{equation*}

e

(15)   \begin{equation*}\frac{dP}{\rho.V^2} \propto -\frac{dA}{A}\end{equation*}

Ou seja, para escoamento supersônico, área e velocidade têm mesmo comportamento e área e pressão têm comportamentos opostos:

  • Um aumento de área dA>0 implica em
    • aumento da velocidade dV>0
    • diminuição da pressão dP<0
  • Uma diminuição da área dA<0 implica em
    • diminuição da velocidade dV<0
    • aumento da pressão dP>0

Por que ocorre a essa mudança de comportamento de subsônico para supersônico? Da Eq.(9):

    \begin{align*}\frac{d\rho}{\rho} &=- M^2.\frac{dV}{V} \\-M^2 &= \frac{\frac{d\rho}{\rho}}{\frac{dV}{V}}\end{align*}

sendo:

  • \frac{d\rho}{\rho}: dilatação da massa específica
  • \frac{dV}{V}: dilatação da velocidade

Quando M<1,

(16)   \begin{equation*}|\frac{d\rho}{\rho}| < |\frac{dV}{V}|\end{equation*}

, o que indica que a dilatação da velocidade é predominante (pouca variação da massa específica. Quando M>1, ao contrário,

(17)   \begin{equation*}|\frac{d\rho}{\rho}| > |\frac{dV}{V}|\end{equation*}

, o que indica que a dilatação da massa específica domina o escoamento.

O bocal de Laval

O bocal de Laval é um bocal convergente-divergente, sendo a única maneira de acelerar um escoamento subsônico para supersônico por processo permanente.

Como o escoamento sônico se comporta quando a área pode variar?

(18)   \begin{gather*}\frac{dV}{V} = -\frac{1}{1-M^2}\frac{dA}{A} \\\frac{dA}{A} = (M^2-1)\frac{dV}{V} \\M=1 \implies \frac{dA}{A} = 0 \end{gather*}

A Eq.18 indica que o escoamento sônico só pode ocorrer onde a área não varia. Dessa forma, temos uma área mínima ou máxima.

Pontos sônicos possíveis

Um escoamento subsônico pode ser acelerado até Mach=1 se a área diminuir. À partir de Mach=1, para acelerar o escoamento supersônico, é necessário que a área aumente.

Rendered by QuickLaTeX.com

Um bocal convergente-divergente permite acelerar um escoamento subsônico para supersônico, com Mach unitário na área mínima

Assim, é possível acelerar um escoamento subsônico para supersônico com um bocal convergente-divergente.

Por outro lado, um escoamento subsônico num difusor, em que a área aumenta, irá desacelerar. A condição em que a área é máxima será uma condição subsônica. Da mesma forma, um escoamento supersônico num bocal, em que a área aumenta, irá acelerar, e a região de área máxima também será supersônica.

Rendered by QuickLaTeX.com

Para um escoamento subsônico, se a área aumenta sua velocidade diminui, portanto ele permanece subsônico até o ponto de área máxima A^*. À partir desse ponto, uma redução da área irá acelerá-lo até o limite de Mach=1.

Rendered by QuickLaTeX.com

um escoamento supersônico com aumento de área irá acelerar, mantendo velocidade supersônica no ponto de área máxima A^*, podendo ser desacelerado com a redução da área até o limite de Mach=1

Portanto, somente um bocal convergente-divergente, ou \textit{Bocal de Laval} pode produzir Mach=1 para a condição em que a variação de área dA é nula.

Projeto de bocal

Estamos interessados em obter uma equação que relacione a área com a área crítica, em que Mach=1. Da equação da continuidade:

    \begin{equation*}\dot{m} = \rho.V.A=\rho^*.V^*.A^*\end{equation*}

(19)   \begin{equation*}\frac{A}{A^*} = \frac{\rho^*.V^*}{\rho.V}\end{equation*}

Podemos relacionar as propriedades críticas e estáticas através das equações para as propriedades de estagnação. Assim:

    \begin{equation*}\frac{\rho^*}{\rho} = \frac{\rho^*}{\rho}.\frac{\rho_0}{\rho_0} = \frac{\rho^*}{\rho_0}.\frac{\rho_0}{\rho}\end{equation*}

Mas

    \begin{equation*}\frac{\rho^*}{\rho} = \frac{2}{k+1}\end{equation*}

e

    \begin{equation*}\frac{\rho_0}{\rho} = \left(1+\frac{k+1}{2}.M^2\right)^{\frac{1}{k-1}}\end{equation*}

Logo:

(20)   \begin{equation*}\boxed{\frac{\rho^*}{\rho} = \left(\frac{2}{k+1}\right)\left(1+\frac{k-1}{2}.M^2\right)^{\frac{1}{k-1}}}\end{equation*}

Rendered by QuickLaTeX.com

Razão entre massa específica característica e estática em função de Mach

Para a velocidade:

    \begin{equation*}\begin{aligned}\frac{V^*}{V} = \frac{\sqrt{k.R.T^*}}{V} \\ \nonumber\frac{V^*}{V} = \frac{\sqrt{k.R.T}.\sqrt{\frac{T^*}{T}}}{V} = \frac{c}{V}\sqrt{\frac{T^*}{T}}\end{aligned}\end{equation*}

Mas \frac{T^*}{T} = \frac{T^*}{T_0}.\frac{T_0}{T} e:

(21)   \begin{equation*}\frac{T^*}{T_0} = \frac{2}{k+1}\end{equation*}

e

(22)   \begin{equation*}\frac{T_0}{T} = (1+\frac{k-1}{2}M^2\end{equation*}

Logo:

(23)   \begin{equation*}\boxed{\frac{V^*}{V} = \frac{1}{M}\left(\frac{2}{k+1}\right)^{\frac{1}{2}}.\left(1+\frac{k-1}{2}M^2\right)^{\frac{1}{2}}}\end{equation*}

Rendered by QuickLaTeX.com

Razão entre velocidade característica e estática em função de Mach

Substituindo na equação para a razão entre as áreas:

(24)   \begin{equation*} \boxed{\frac{A}{A^*} = \frac{1}{M}\left(\frac{2}{k+1}\right)^{\frac{1}{2}.\frac{k+1}{k-1}}\left(1+\frac{k-1}{2}M^2\right)^{\frac{1}{2}.\frac{k+1}{k-1}}}\end{equation*}

A Eq.(24) nos fornece a razão entre a área e a área crítica em função do número de Mach. Conforme o gráfico, para cada razão de áreas existem dois números de Mach que satisfazem a equação, um subsônico e outro supersônico.

Rendered by QuickLaTeX.com

Para dada razão entre área e área crítica, dois pontos no gráfico satisfazem a equação: um subsônico e outro supersônico.

Exemplo

Escoamento entra num bocal convergente-divergente com M_1=0,05. A pressão de estagnação do gás é P_{01} = 20 MPa e T_{01}=300K, k=1,2. Determine a razão entre a área e a área crítica para obter Mach=1. Se a razão entre a área de saída e a área crítica é de 30, qual o valor de Mach na saída?

Substituindo na Eq. 24, temos:

    \begin{equation*}\frac{A}{A^*} = \frac{1}{0,05}\left(\frac{2}{1,2+1}\right)^{\frac{1}{2}.\frac{1,2+1}{1,2-1}}\left(1+\frac{1,2-1}{2}0,05^2\right)^{\frac{1}{2}.\frac{1,2+1}{1,2-1}} = 11,85\end{equation*}

Se \frac{A}{A^*} = 30, podemos estimar um valor de Mach e iterar até convergir. Assim:

* M=2 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 1,88
* M=4 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 28,35
* M=5 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 116
* M=4,5 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 57,95
* M=4,1 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 32,74
* M=4,05 \rightarrow \frac{A}{A^*} = 30,47